Resistindo pelo afeto

Tá me ouvindo? Você tá muda. Tão conseguindo ver minha tela? Vou tirar a câmera pra ver se melhora. A conexão hoje aqui tá ruim, tô caindo toda hora. Filho, agora mamãe não pode brincar. Ah, você tem gato, que fofinho! Preciso sair em ponto, tenho outra reunião na sequência.

Deu pra ver do que estamos falando, né? Isso mesmo, 2020 (seu lindo!) #sqn. O ano em que uma parte do trabalho do mundo foi realizado virtualmente trouxe desafios e não foi diferente pra nós aqui na Tistu. É que a gente gosta de uma aglomeração e de fazer as coisas com as mãos, sabe? Pra quem não usava nem apresentação em PowerPoint, ter de adaptar tudo pro online — o tempo todo — foi doloroso. Fazendo um balanço do que foi o ano e planejando 2021, tivemos um momento para enlutar devido às perdas do trabalho virtual, mas também de celebrar o que conquistamos, produzimos e nos desenvolvemos nesse período.

A primeira coisa foi reconhecer e agradecer pelo privilégio de exercermos uma atividade que foi possível ser realizada 100% virtual. Num ano em que milhões se viram sem alternativas, essa gratidão não pode virar clichê. Tem de ser reverenciada, mas sem cair em uma positividade tóxica. Trabalhar assim exigiu muito mais esforço da nossa parte em muitos sentidos. Já em março, tínhamos a 4ª edição da Oficina A Pele Que Habito • t r a b a l h o • para acontecer presencialmente e conseguimos adaptar para fazer online. Fomos com medo mesmo e deu super certo. Um obrigado especial a quem participou dessa edição e topou embarcar com a gente!

Uma pesquisa que fizemos entre clientes e amigos ainda em abril (E você, como está?) nos revelou que as interações de trabalho (O que mudou agora que suas reuniões são online?) estavam mais objetivas, mas aumentaram muito em termos de quantidade. Traduzindo para o nosso trabalho: o tempo disponível que tivemos com os grupos foi significativamente reduzido porque a percepção de como ele deve ser utilizado é, mais que nunca, direto ao ponto. Que pena, pois a beleza está no caminho.

Para além das consequências negativas que a perda qualitativa de socialização terá sobre os grupos de trabalho (tema para outro texto), esse cenário fez com que a gente aportasse muito mais do nosso tempo no preparo de cada encontro na busca da metodologia que pode ser adaptada, a plataforma que pode ser usada, hooooras fazendo PowerPoints, se seria possível espremer alguma atividade para explorar o sutil que vive no grupo etc. Muita energia criativa e também muita resignação em sermos conservadoras para não deixar de entregar o mínimo esperado. E um novo desafio: mostrar a clientes que o mundo virtual demanda mais horas nossas, mesmo com menos tempo de workshops. Impacto direto nos orçamentos.

E falando nisso, revisitamos os trabalhos e finanças de 2020. Tivemos um total de 26 projetos, 1 a mais que no ano anterior. Ainda assim, faturamos 55% menos que em 2019, uma constatação que nos assustou num primeiro momento. Refletindo sobre a realidade, vimos que ainda assim conseguimos nos manter sem traumas. Parte disso foi por termos transparência sobre nossas finanças pessoais, o que permitiu uma distribuição fraterna e diferente entre nós. E isso é motivo de muita celebração! Evoluímos da transparência financeira para uma distribuição que considera a realidade individual.

Outra parte foi que o isolamento social fez a gente gastar menos. Alguns vão falar que é apertar o cinto, mas olhando mais de perto, dá pra dizer que ajudou a frear, um pouco, o nosso consumismo, desenvolvendo até alguns hábitos que devem perdurar, como cozinhar, ler e estudar mais! O triste mesmo ficou pelo fechamento da Vilynda, local que dividíamos escritório com organizações que admiramos muito, como Pimp my Carroça/ Cataki, Instituto Update, Pacto pela Democracia, Instituto Procomum, Maranha, Bela Baderna entre outras. Era uma economia que não queríamos fazer, mas ganhamos amigos e parceiros para seguir na jornada, mesmo não tendo mais o espaço físico compartilhado!

Mas o mais dolorido do ano foi a saída da nossa 4ª parte, a Márcia. Por questão financeira momentânea (anterior à pandemia, mas agravada por essa situação), ela saiu da sociedade para enfrentar desafios de outro tipo em um trabalho CLT. Ela é a única de nós que é mãe – isso já dá tanto pano pra manga que nasceu um novo projeto (Mães em Quarentena). Te aguardamos em breve, Má!

Um dado que a gente gosta muito de olhar é o número de pessoas que conseguimos interagir num ano. Em 2020 foram cerca de 350, muitas delas fora de São Paulo e até do Brasil, o lado positivo do mundo online! Criamos a Formação Do Caos à Arte – Melhorando Encontros Online e realizamos uma turma aberta e uma in company. E um pouco antes do ano acabar, debutamos com A Pele Que Habito in company, se revelando também uma ótima oficina de Team Building para organizações mais colaborativas.

E como será 2021? Tudo indica que o cenário não deve mudar, afinal, mesmo tendo vacina, não será pra todo mundo e nem em pouco tempo. Fatos se misturam às opiniões e aos anseios de normalidade para que as recomendações de distanciamento social não sejam cumpridas. Uma justificativa bastante presente tem sido a necessidade de cuidar da saúde mental. Acreditamos na política e na economia do cuidado. Para que ela exista e floresça é preciso o entendimento que isso é tarefa de todas as pessoas e em todos os lugares a todo o momento. Sobretudo no trabalho, onde é dedicada a maior parte do tempo e energia. Queremos contribuir para que mais organizações despertem para o ganho de qualidade de vida e produtividade que os momentos de interação de trabalho podem trazer se também proporcionarem momentos de cuidado mental e emocional.

Seguimos. Tentando ser melhores. Primeiro internamente. E resistir no afeto para persistir encorajando beleza, sentido e espiritualidade.

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